quinta-feira, 17 de outubro de 2013

FADADO PARA FALHAR






Canídeo expressando a sua opinião sobre o desempenho do governo


   Depois de o governo ter falhado miseravelmente as metas do défice e da dívida em 2011, 2012 e 2013, depois de Gaspar ter batido a porta com estrondo e declarado que este caminho não tem sentido, depois do irrevogável Portas ter revogado a sua irrevogável demissão porque haveria um vislumbre de mudança de política (com o reforço da sua vaidade e dos seus poderes), afinal, o governo vem propôr um orçamento fadado para falhar.

   E porquê?

    Porque, tal como os anteriores, falhará as metas que se propõe alcançar?
   Porque as contas de merceeiro que apresenta não têm a mínima consistência com a realidade?
   Porque inevitavelmente, e à semelhança dos orçamentos anteriores, a receita vai ficar abaixo e a despesa, acima do previsto?

   Não.

   Este orçamento difere substancialmente dos anteriores. Não porque não vá chocar contra a parede da realidade, mas porque vai intencionalmente contra ela.

   Expliquemo-nos.

   Porque é que um orçamento que é feito em cima de três falhanços consecutivos aprofunda ainda mais o modelo já falhado? Porque o propósito é falhar.

   Por isso é que este orçamento é tão deliberadamente inconstitucional. Por isso é que a própria Albuquerque fala tão abertamente em “riscos constitucionais”, acrescentando que não há plano B.

   Por isso é que a barragem de artilharia pesada que se abateu sobre o Tribunal Constitucional foi intensificada nos últimos tempos.

   Esperam, o governo e a Troika, que deste modo o TC “reaja” aos ataques, virando-se contra o governo e chumbando o essencial do orçamento. E o objectivo do governo é esse: Que o seu próprio orçamento venha a ser chumbado por flagrante inconstitucionalidade.

   Uma vez chumbado o orçamento, a Troika poderá dizer: “O programa é bom, mas não pôde ser cumprido por causa dos obstáculos constitucionais, logo a culpa não é nossa nem do nosso excelente plano”;

   E o governo poderá dizer à Troika: “Não nos deixaram executar fielmente o programa, logo a culpa não é nossa nem da nossa vontade em implementar o vosso excelente plano”;

   E a Troika responderá: “Já que a culpa não é nossa nem vossa, celebremos o sucesso do programa, tomem lá o resto do dinheirinho e paguem aos credores”.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

COMÉDIA DE ENGANOS







   Estamos numa corrida de 5000 metros, e nove das doze voltas já ficaram para trás.

   Os anos de chumbo também já ficaram para trás.

   Não haverá mais austeridade (para além daquela que já tinha sido anunciada mas ainda não aplicada).

   Haverá só uma sucessão de pequenos e médios cortes e apenas nos ministérios.

   Afinal, sempre haverá um bocadinho de austeridade: o assalto às viúvas.

   As notícias acerca do assalto às viúvas são manifestamente exageradas.

   Quem deixou fugir a notícia de que haveria um assalto às viúvas?

   Afinal, confirmo que há um assalto, mas só às viúvas ricas.

domingo, 6 de outubro de 2013

RESGATADOS FOMOS NÓS







  Bagão Félix, o insuspeito dirigente do CDS e ex-ministro das finanças de Santana Lopes, explica com candura e até com algum desconforto, a natureza e o alcance do resgate que Portugal foi obrigado a engolir.
  Com efeito, nos números que apresenta e cujo significado tão bem demonstra, fica claro que o resgate teve por destinatários os nossos credores e não a nossa economia. 
  À medida que a Troika nos "ajuda" com empréstimos, esse dinheiro vai todo para pagar aos credores, que assim se livram da nossa dívida "tóxica" e vão a correr comprar dívida "boa", da Alemanha e dos outros países do norte, os tais que nos estão a "ajudar". 
  Os sacrifícios estúpidos e inúteis que se abateram sobre os portugueses servem, a final, para engordar o bolso dos agiotas que não pretendem senão receber tudo até ao último cêntimo. Ainda bem que pertencemos a uma "União"!  
  É caso para os nossos credores dizerem: "Resgatados fomos nós!". 

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

A VITÓRIA DOS INDEPENDENTES




   
  O fenómeno destas eleições foi indiscutivelmente o das candidaturas independentes. Com efeito, o “partido” dos independentes foi o quarto mais votado, com treze Câmaras, mais do que dois partidos com assento parlamentar, o CDS e o BE.
   Um olhar mais atento impõe-se sobre estas candidaturas. Quantas delas são verdadeiramente independentes, ou seja, descontando as deserções partidárias, quantas ficam? Provavelmente nenhuma.
   Significa isto que os “independentes" não o são, de facto. Acontece que os candidatos que não foram escolhidos pelas estruturas partidárias viram-se forçados a desertar e a concorrer à margem dos partidos, dos seus partidos. Fosse outra, a escolha, e estes candidatos não teriam deixado os partidos.

   Que lições se podem tirar deste fenómeno?

   Que os partidos cometeram “erros de casting” ao escolher o candidato A em detrimento do candidato B. Ora, isso só é verificável após e não antes das eleições.
   Que as estruturas locais não “ouviram” os militantes ou as “forças vivas do concelho”.
   Que as escolhas das direcções nacionais dos partidos se sobrepuseram às escolhas locais, o que evidencia um “desconhecimento do terreno”, ou seja, a má escolha é atribuível à “falta de diálogo”.

   Ou, pura e simplesmente, que é preciso mudar a forma de fazer política neste país, e a começar desde logo pelo princípio, isto é, pela escolha dos candidatos.
   Advogamos a instituição de eleições primárias nos partidos. Assim:

1 - Qualquer pessoa, militante ou não, deve poder candidatar-se pelo partido cuja tábua de valores e princípios mais se identifica com a sua.
2 – Os diferentes candidatos apresentam os seus programas e a discussão é feita em torno destes, e não na contagem de espingardas junto dos militantes.
3 – Havendo um debate entre programas, emerge, em princípio, o melhor de entre eles, não necessariamente aquele que seria o preferido pelas estruturas locais ou nacionais. É esta a melhor forma de impedir a perpetuação de caciques.
4 – Os candidatos são escolhidos pelos eleitores, pelos votantes, e não por um reduzido número de militantes ou um ainda mais reduzido número de dirigentes.
5 – A escolha dos eleitores nas primárias aproximar-se-á da escolha nas eleições autárquicas. Será maior, a participação eleitoral, visto que os eleitores irão votar no "seu" candidato e não em alguém que lhes foi imposto.

   Se os partidos fossem inteligentes, se a escolha dos candidatos tivesse sido feita com recurso a eleições primárias, o PSD não teria perdido o Porto e Gaia, e o PS não teria perdido Matosinhos, por exemplo.

   Se os partidos forem inteligentes, mais tarde ou mais cedo acabarão por perceber que as primárias podem funcionar a favor, e não contra eles. Mas para isso, os partidos têm que deixar de ser um fim para passarem a ser apenas um meio de acesso ao poder. E esse salto ainda está por dar.  

E O VENCEDOR É...





  Duas reflexões acerca das eleições autárquicas.

Primeira: Os resultados.

Vamos aos factos:
1 - O PSD perde o maior número de votos, mandatos e Câmaras, logo, perde as eleições;
2 – O PS ganha o maior número de votos, mandatos e Câmaras, logo vence as eleições.

   À primeira vista, é esta, a ilação essencial a retirar das eleições. Mas a leitura seria superficial se ficasse por aqui. Senão, vejamos.

   O PSD perde Porto, Gaia e Sintra, três das maiores Câmaras do País, e perde a presidência da Associação Nacional de Municípios. Porém, consegue ganhar Câmaras importantes como Guarda e Braga e aguenta-se razoavelmente bem um pouco por todo o país, à excepção da hecatombe madeirense, onde os locais manifestam finalmente o seu enjoo pelo partido laranja. A sua distância para o PS cifra-se em pouco mais ou menos dez pontos percentuais. Para um partido que conduziu o país ao estado de calamidade em que se encontra e persiste na receita – aliás, vincada no discurso de derrota de Passos, o resultado, sendo mau, não é péssimo.

   O PS, por seu lado, ganha as eleições, mas de nada lhe serve a vitória; é que não bastava ganhar, era preciso esmagar. E o PS não esmagou. Ficou apenas uns dez pontos à frente do seu adversário e a outros tantos da maioria absoluta. É uma vitória murcha.

   O que o PS precisava era de ter no quadro nacional a vitória que teve em Lisboa: Um PS esmagador, com uma clara maioria absoluta, e um PSD vergado a uma derrota humilhante. 50% contra 20%.


   Essa vitória ocorreu, sim, mas não para Seguro. O claro vencedor da noite foi António Costa. O seu discurso de vitória, circunstancialmente local, foi substancialmente nacional. Todos sentiram – os que estavam naquela sala e os que o escutaram pela televisão – que é nele, e não em Seguro, que reside a solução para vencer a direita. Costa conseguiu o resultado que Seguro não alcançou. Faça-se a óbvia leitura.  

domingo, 22 de setembro de 2013

REGRESSO AOS MERCADOS


  Em dezanove de Março de 2012, em Washington, O ministro Vítor Gaspar anuncia que "23 de Setembro de 2013" será o dia em que Portugal voltará aos mercados.

Vítor Gaspar marca regresso aos mercados no final de setembro de 2013 - Política - Notícias - RTP

  É interessante pesquisar a imprensa e verificar que aqueles que se iludiam acerca do "ajustamento" são os mesmos que hoje continuam a dizer que isto está a correr bem.





  Quando a realidade desmente as inculcações, torce-se a realidade. Há um ano e meio, Portugal estaria e crescer e iria aos mercados sem ajuda da Troika. Hoje, discutem se o défice para 2014 terá como meta 4% ou 4,5% - como se isso tivesse alguma importância, visto que, desde que estes mentecaptos estão no governo, todos os défices foram "martelados" e ainda assim, furaram as previsões, mesmo depois de revistas pela Troika - e o segundo resgate, com este ou outro nome, é uma inevitabilidade face ao clamoroso falhanço desta coisa a que chamam governo.

  Reparem que os discursos do ministro e do papagaio pseudo-jornalista são coincidentes. E os riscos de falhar o regresso seriam externos: Espanha, Itália ou Grécia. 
  Afinal, o inimigo dorme connosco e tem um nome:  Governo de Passos Coelho.



sexta-feira, 20 de setembro de 2013

A FARSA DAS AVALIAÇÕES DA TROIKA




A troika a avaliar os meninos. De "Pink Floyd: The Wall".

  Estão a decorrer as "avaliações" da Troika. A especulação sobre o resultado destes exames gira em torno de dois pontos:

  a) Aprovará a Troika as medidas do governo e dará luz verde para mais uma tranche do empréstimo;

  b) Será sensível aos argumentos do governo e flexibilizará as metas do défice para 2014.

  Chamemos os bois pelos nomes e sejamos claros e cristalinos: As avaliações ou exames são uma farsa. É óbvio que as avaliações serão sempre positivas porque não está nem nunca esteve em causa fazer depender a atribuição dos empréstimos do resultado das "avaliações".

  E porquê? Porque o objectivo do resgate é justamente emprestar dinheiro a Portugal para que este possa pagar aos credores. Não nos esqueçamos que quem foi resgatado foram os credores e não nós; por isso está fora de questão que os bancos tóxicos - FMI e BCE - se abstenham de emprestar o dinheiro que serve para pagar aos seus clientes, os credores, por causa de uma avaliação negativa, o que aliás, nunca aconteceu nem irá acontecer até esta tragédia chegar ao fim.

  Assim, a encenação ou simulacro de negociações mais ou menos duras apenas serve para que as partes cumpram os seus respectivos papéis e façam o seu número de circo. 

  A Troika vai fazer de "pai severo" ou de "polícia mau", relutante em abrir os cordões à bolsa até que, no final, lá concede e dá um voto (mais um) de confiança ao governo.

  O governo, protagonizado pelo irrevogável Portas, dará ares de "durão" (sem relação com o patife que preside à Comissão Europeia) e sairá das negociações com uma "vitória", porque conseguiu que a Troika lá desse o dinheirinho. 

  É uma farsa grotesca, já que o resultado é combinado à partida e os players, governo e Troika, sabem de antemão que apenas desempenham um insignificante papel de peões. Tudo já está previamente decidido. A Troika entrega o dinheiro a Portugal e este paga aos credores: É esta e não outra a natureza e finalidade do resgate.


O irrevogável Portas em pose de Estado.


  A farsa em torno das metas do défice para 2014 é ainda mais patética. É que:

1 - O governo ultrapassou sempre as metas do défice originalmente previstas;
2 - A Troika reviu sistematicamente em alta as metas;
3 - O governo violou sistematicamente as metas já revistas;
4 - Nunca houve sanções da Troika ao governo(já não dou o dinheirinho).

  Na verdade, no documento original, as metas do défice eram as seguintes:

2011 - 5,9%

2012 - 4,5%

2013 - 3,0%

  Quais foram os resultados alcançados pelo governo?

  Em 2011, o défice foi "martelado" com uma receita extraordinária, a transferência do fundo de pensões da Banca, sem a qual o resultado teria sido de 7,7%, ou seja, 1,8% acima da meta.

  Em 2012, o défice foi novamente "martelado" com receitas extraordinárias provenientes das privatizações. Ainda assim, ficou em 6,6%, ou seja, 2,1% acima da meta. Já na recta final do ano, a Troika flexibilizou a meta para 5,4% (mais 0,9% de "bónus"). Não obstante, o governo falhou miseravelmente e ficou 1,2% acima da meta já flexibilizada.

  Para 2013, a meta era de 3%. Dizemos "era" porque, no final do primeiro semestre, vamos com um défice de 7%.

  Inútil, portanto, pretender que iremos ter negociações duras com a Troika a este respeito. Será um dejá vu outra vez, perdoem-me a redundância. O governo irá, como sempre, falhar redondamente as metas iniciais, falhar redondamente as metas "flexibilizadas", a Troika irá aumentando as metas de flexibilização em flexibilização e, no fim, o governo voltará a falhar, sem que nada lhe aconteça.

 Enquanto esta farsa decorre, cem mil portugueses emigram por ano, um milhão está sem trabalho e outro milhão vive indignamente trabalhando à jorna como há cem anos, à tarefa ou ao mês, a recibo verde ou na absoluta clandestinidade.